sábado, 19 de junho de 2010

Segunda noite de cenas curtas
Por Brígida Alvim

Como é bom voltar ao espaço Galpão Cine Horto para assistir ao Festival de Cenas Curtas. Ver aquela movimentação toda, a correria dos contra-regras e produtores, os improvisos, as cenas sendo montadas bem em frente aos nossos olhos, aguçando nossa curiosidade. Reencontrar pessoas num clima amistoso, agitado e de expectativas.

A noite de quinta-feira desta 11ª edição estava, num ponto ideal de público; nem muito cheio, nem vazio. Fui subindo os degraus da arquibancada. Um aceno aqui e outro ali, vários rostinhos conhecidos. Consegui um bom lugar para sentar e, após muitos avisos e comunicados passados pelo cada vez mais simpático e bonito Léo Lessa, a luz foi apagada e iniciou-se a seqüência de cenas esperadas. A primeira veio a convite da casa para intercâmbio: “O funeral”, da cidade de Salvador. Num misto de dança, performance cênica e palhaçadas, a artista, sozinha no palco, expôs um belo drama pessoal. Ora a personagem se amolava com os espirros contínuos que a agoniavam, ora se aborrecia com o casaco que não a cobria por completo. Pequenas amolações e conflitos se passaram metaforicamente. Mas é claro que humor não faltou à cena, mesmo com o grande sofrimento vivido no final, quando a palhaça teve de enfrentar a morte de seu agasalho querido. E então vieram “Alpondras”, “Flicts”, “Eu tu elas” e, finalmente, “As lágrimas amargas de Petra Von Kant”.

As lágrimas amargas de Petra Von Kant

A cena retrata a história de uma polêmica personagem alemã, registrada em filme e em outras obras, inclusive uma marcante montagem teatral que teve Fernanda Montenegro como protagonista. Petra Von Kant é uma estilista bem-sucedida, de personalidade arrogante e irreverente. Seu portfólio é exibido de um lado para outro, transportado por modelos, em desfiles glamorosos. O sucesso é pleno; Petra é admirada, reverenciada, aplaudida. E aplaude também, a si mesma e à vida, até o dia em que a desgraça cai sobre si. O infortúnio de sua vida é causado por uma paixão arrebatadora, não correspondida, que faz dela prisioneira, condenada a sofrer seus piores dias. A intensa paixão é dedicada a uma bela modelo, que soube tirar proveito da situação e depois trair-lhe, humilhar-lhe e desprezar-lhe.

A estilista entra em depressão profunda e vai do topo ao caos. Essa transição é bem retratada por Fábbio Guimarães que, além de interpretar a personagem principal, é quem dirige a cena. No palco, é exposto o processo de decadência de Petra, evidenciado principalmente pelas feições e gestos interpretados. Estão em cena Fabiana Bergamini, que faz a modelo, e Fernando Barcellos, como a criada.

Outros aspectos significativos para compreensão da montagem, utilizados de forma sutil e inteligente nessa cena: as roupas sendo jogadas e espalhadas pelo chão – gesto feito e repetido várias vezes pela criada da casa – que contribui para configurar o cenário caótico que foi estabelecido pela decepção amorosa; os movimentos corporais que representaram o ato sexual praticado entre a modelo e o amante, sem que precisasse haver algo próximo do explícito; as cabeças raspadas como elemento comum entre Petra e a criada, utilizado para criar identificação entre elas; as músicas, os silêncios, os olhares e, certamente, o instante final, em que a personagem atira o pente contra o espelho, demonstrando ódio e reforçando sua degradação.
Enfim, parabenizo o grupo pela proeza de interpretar de forma autêntica e desprendida Petra Von Kant e suas lágrimas amargas!

Um comentário:

  1. Brigida parabens pelo texto , e pela percepção dos signos da cena e suas palavras sobre a cena. Mostra um texto bem escrito e uma sensibilidade artistica apurada. Lindoooo !!!!!!!!!!!!!!!!!

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