Uma novidade trazida pela nona edição do Festival de Cenas Curtas agregou mais valor às premiações: o Cena Espetáculo, em que uma cena de Belo Horizonte é eleita para se transformar em espetáculo, com apoio e infraestrutura oferecidos. Com a iniciativa, o Galpão Cine Horto pretende ser um pólo agregador de idéias e propostas artísticas. O coordenador geral do espaço, Leonardo Lessa, destaca que a iniciativa nasceu por consequência natural do próprio festival, espelhando-se na ação espontânea e já recorrente de montagem do espetáculo a partir da cena, por parte dos artistas. A seleção é feita por comissão especializada, composta por membros do Grupo Galpão e convidados, que avaliam critérios como qualidade da cena, o potencial de se transformar em espetáculo, assim como o de seus criadores em executar a empreitada.
Em 2008, a cena que preencheu tais requisitos e recebeu a premiação foi Av. Pindorama, 171, dirigida por Henrique Limadre. Segundo o diretor, o Cenas Curtas é local muito propício para experimentações, como descreve: “Estávamos num momento de experimentar a linguagem e queríamos ter o gostinho de testá-la numa cena de 15 minutos. Foi ideal porque o clima de competição e a oportunidade do voto deixam o público quente, participativo. Com isso, recebemos retorno imediato sobre a funcionalidade da linguagem: fomos eleitos pelo júri popular como a melhor cena da noite”.
Consolidado a partir dessa experiência, o Teatro 171 estreou em março de 2009, com temporada entre os dias 5 e 21, no Galpão Cine Horto. “Transformar o Av. Pindorama em espetáculo já era um desejo nosso desde a preparação da cena, quando começamos a discutir as primeiras idéias. Mas a premiação fez com que pudéssemos antecipar a realização do projeto”, conta Fabiana Bergamini, que compõe o elenco junto a Patrícia Diniz, Marina Viana, Cléo Magalhães e Gabriel Castro.
O grupo reconhece o Cena Espetáculo como um marco na concepção da peça, mas argumenta que a falta de recursos financeiros (que até então não era incluído na premiação), foi fator que dificultou significativamente a realização. Por outro lado, pondera Fabiana, “as dificuldades foram determinantes para gerar crescimento e autoconfiança no grupo”. Para vencer o problema, já que o projeto também não foi aprovado em leis de incentivo à cultura, o Teatro 171 desenvolveu uma campanha para captar recursos por meio de vendas de ingressos antecipados. A campanha Bananas aos Ventos arrecadou em torno de R$6.500 graças à mobilização dos artistas e à confiança do público. Com isso, demonstrou que antigas formas de se realizar projetos artísticos podem servir de alternativas viáveis nos dias de hoje.
“Foi uma das coisas mais bacanas que já vi acontecer na cidade, em termos de mobilização para se concretizar uma proposta artística. O mercado está muito limitado ao formato de leis de fomento a patrocínio, que parece ter se tornado um modelo. No entanto, não devemos condicionar nossos projetos a esse formato apenas, pois não é a única forma de captar recursos”, recomenda Leonardo Lessa.
Sobre a falta de verba para a montagem em 2008, Lessa justifica que, por se tratar de um projeto piloto, não houve condições de oferecer o recurso na ocasião. Já na 10ª edição, o projeto vai oferecer R$5.000 como auxílio-montagem. “Sabemos que não é suficiente, mas pretendemos amenizar as dificuldades sem desestimular as iniciativas por parte do grupo. Por respeitarmos a autonomia dos artistas, consideramos importante que tenham oportunidade de buscar alternativas de financiamento e parcerias”.
Outro importante recurso implementado nessa edição como facilitador da transformação da cena em espetáculo é a orientação no processo de criação do trabalho, pelo dramaturgo Luís Alberto de Abreu. “Vamos oferecer esse apoio porque transformar uma cena de quinze minutos em espetáculo é, acima de tudo, um desafio dramatúrgico. Outros elementos como linguagem, direção e atuação já vêm definidos na cena”, explica Leonardo Lessa.
Av. Pindorama, 171: encontros e acontecimentos
Av. Pindorama, 171 foi criado em um processo colaborativo pelo grupo e carrega nítidas influências do dadaísmo, surrealismo e modernismo. Tem como tema norteador o Brasil e suas contradições socioeconômicas e culturais, representado por cinco personagens e seus respectivos universos, dentro de um contexto urbano contemporâneo. A camelô Kátia Vanderlúcia, a aliciadora de mulheres Suelen, que combina encontros pelo telefone público, “Loirinho”, o entregador de pizza, e “Guru”, o “doidinho de rua” que exibe uma crença religiosa em meio ao caos, são ícones que dão vida à cena ressaltando temáticas socioeconômicas, de sexualidade, de sincretismo religioso, entre outras. Um fato é elo de ligação entre esses personagens: o atropelamento que causa a morte de um cidadão comum. Os vários pontos de vista que narram o fato, cada um contextualizado a seu universo, oferece elementos que proporcionam aos espectadores, além de muita diversão, uma reflexão ampla.
O 171 demonstra autenticidade por possuir identidade própria de estética e linguagem, que tem como principal característica a ironia e a crítica, capaz de provocar riso e constrangimento. Um trabalho intenso de pesquisa foi realizado com o objetivo de criar um paralelo entre aspectos da realidade brasileira atual e acontecimentos históricos da antiguidade. As associações atravessam séculos e barreiras geográficas. Um destaque importante nesse sentido é a reflexão levantada acerca das embarcações européias colonizadoras da América Latina e as possíveis consequências assinaladas no comportamento de ícones populares.
Outros trabalhos do Teatro 171, em circulação:
- O Circo do Lixo, direção de Eduardo Moreira e Chico Aníbal;
- Cabaré da Loucura, direção de Docimar Moreira, em cartaz esse mês no projeto Bar de Papo, em Juiz de Fora e Barbacena.
Corrigindo, o endereço do blog é: teatro171.blogspot.com
ResponderExcluirA Kátia é Kátia Vanderluce, não Vanderlúcia...
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ResponderExcluirÔ meu Deus, errei o nome da moça... Desculpe gente, é Kátia Vanderluce! Bjs.
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